O
impacto do aquecimento global será "grave, abrangente e
irreversível", segundo um relatório do Painel
Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC,
na sigla em inglês) da Organização
das Nações Unidas (ONU)
divulgado ontem (31/03/14). Autoridades e cientistas reunidos no
Japão afirmam que o documento é a avaliação mais completa já
feita sobre o impacto das mudanças climáticas no planeta.
Integrantes do IPCC dizem que até agora os efeitos do aquecimento são sentidos de forma mais acentuada pela natureza, mas que haverá um impacto cada vez maior sobre a humanidade. Mudanças climáticas vão afetar a saúde, a habitação, a alimentação e a segurança da população no planeta, segundo o relatório.
O teor do documento foi alvo de
intensas negociações em reuniões realizadas em Yokohama. Este é o
segundo de uma série de relatórios do IPCC previstos
para este ano.
O texto afirma que a quantidade de provas
científicas do impacto do aquecimento global dobrou desde o último
relatório, lançado em 2007. "Ninguém neste planeta ficará
imune aos impactos das mudanças climáticas", disse o diretor
do IPCC,
Rajendra Pachauri, a jornalistas ontem (31/03/14).
O
secretário-geral da Organização
Meteorológica Mundial (OMM),
Michel Jarraud, disse que se no passado as pessoas estavam destruindo
o planeta por ignorância, agora já não existe mais esta
"desculpa".Enchentes
e calor:
O
relatório foi baseado em mais de 12 mil estudos publicados em
revistas científicas. Jarraud disse que o texto é "a mais
sólida evidência que se pode ter em qualquer disciplina
científica".
Nos próximos 20 a 30 anos, sistemas como o mar do Ártico estão ameaçados pelo aumento da temperatura em 2 graus Celsius. O ecossistema dos corais também pode ser prejudicado pela acidificação dos oceanos.
Na terra, animais, plantas e outras espécies vão
começar a "se deslocar" para pontos mais altos, ou em
direção aos polos.
Um ponto específico levantado pelo
relatório é a insegurança
alimentar.
Algumas previsões indicam perdas de mais de 25% nas colheitas de
milho, arroz e trigo até 2050.
Enquanto isso, a demanda por
alimentos vai continuar aumentando com o crescimento da população,
que pode atingir nove bilhões de pessoas até 2050.
"Na medida em que avançamos [as previsões] no futuro, os riscos só aumentam, e isso acontecerá com as pessoas, com as colheitas e com a disponibilidade de água", disse Neil Adger, da universidade britânica de Exeter -- outro cientista que assina o relatório.
"Na medida em que avançamos [as previsões] no futuro, os riscos só aumentam, e isso acontecerá com as pessoas, com as colheitas e com a disponibilidade de água", disse Neil Adger, da universidade britânica de Exeter -- outro cientista que assina o relatório.
Enchentes e ondas de
calor estarão entre os principais fatores causadores de mortes de
pessoas. Trabalhadores que atuam ao ar livre -- como operários da
construção civil e fazendeiros -- estarão entre os que mais
sofrerão. Há também riscos de grandes movimentos migratórios
relacionados ao clima, além de conflitos armados.
Quem paga?
Quem paga?
Em
lugares como a África, as pessoas estarão particularmente
vulneráveis. Muitos que deixaram a pobreza nos últimos anos podem
voltar a ter condições de vida miseráveis.
Mas o professor Saleemul Huq, outro coautor do relatório, disse que os países ricos não estarão imunes. "Os ricos terão que se preparar para as mudanças climáticas. Estamos vendo isso agora na Grã-Bretanha, com as enchentes de poucos meses atrás, as tempestades nos Estados Unidos e a seca no Estado da Califórnia", disse Huq.
"Estes eventos são multibilionários, que precisam ser pagos pelos ricos, e existe um limite no que eles podem pagar."
Outro coautor, Chris Field, apontou que existem alguns lados positivos do relatório. Segundo ele, o mundo tem condições de administrar os riscos previstos no documento.
"Aquecimento global é algo muito importante, mas nós temos muitas ferramentas para lidar de forma eficiente com isso. Só é preciso lidar de forma inteligente com isso", diz Field.
Mas um dos problemas que ainda não tem resposta é: quem pagará a conta?
"Não cabe ao IPCC definir isso", disse José Marengo, cientista brasileiro do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que participou das negociações em Yokohama.
"O relatório fornece a base científica para dizer que aqui está a conta, alguém precisa pagar, e com essas bases científicas é relativamente mais fácil ir às negociações da UNFCCC [Convenção Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas] e começar a costurar acordos sobre quem pagará pela adaptação [do planeta]."O que é o IPCC?
A função do Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), nas suas palavras é "suprir o mundo com visões científicas claras sobre o estado atual do conhecimento em mudanças climáticas e seus potenciais impactos ambientais e socioeconômicos".
Com o aval da ONU, a entidade já produziu quatro grandes relatórios até hoje.
O IPCC é uma organização pequena, sediada em Genebra e com uma equipe de 12 funcionários que trabalham em turno integral. Todos os cientistas que colaboram com o painel o fazem de forma voluntária.
FONTE:BBC Brasil
Matt McGrath
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